Gustavo desamassa, com um martelo de borracha, o escapamento de uma CG 125, 1978, gerando estrondos que chocam como metal em seus ouvidos. Dá cada martelada com a convicção de que exerce a profissão correta: mecânico de motos. Observa a rua em frente à oficina. O sol que se reflete nos paralelepípedos faz seus olhos verdes lacrimejarem. Com a mão e o braço, limpa o suor do rosto sardento, ainda com poucos pêlos, à maneira que viu outros mecânicos fazerem. A seca persiste há quarenta dias em Passo Fundo, no norte do Rio Grande do Sul. Seu chefe na oficina conversa, ao telefone, com o irmão, que é subversivo, dizem os vizinhos. Por ser motoqueiro e cabeludo, Gustavo também é denominado subversivo, pelos mais velhos. Porém, desconhece por que o irmão de seu chefe luta para acabar com a ditadura militar. Nunca viu nada diferente de generais sendo escolhidos pelo Congresso Nacional. Tinha três anos de idade quando houve o Golpe Militar de 1964. Agora, aos 17, pensa na profissão, na namorada...